sexta-feira, janeiro 30, 2009

Igualdade virtual

Assim que estacionei, aquele garoto ruivo, de bermuda jeans e camiseta encardida, correu até mim e pediu para guardar o carro enquanto eu passeava no shopping center. Aceitei, recomendando a ele que realmente ficasse de olho no veículo. O menino devia ter uns 15 anos, era franzino, tinha os olhos negros como as noites de verão, a pele queimada de sol e o sorriso largo.

E lá fui eu, rodar entre vitrines enfeitadas, feitas unicamente para despertar a vontade de comprar. O shopping é a Meca do capital. Nele, os desejos humanos são colocados à prova e, para ser feliz, basta levar alguns produtos para casa. É a lógica da transferência, que induz muitas pessoas a buscarem a realização através das faturas de um cartão de crédito. Quem pode, paga à vista. Quem não pode, parcela a falsa felicidade em suaves prestações.

O motivo que me levou ao shopping era simples. Trocar uma blusa que ganhei recentemente e ficou apertada. Gastei 20 minutos para realizar esse procedimento e voltei até o local onde o carro estava estacionado. Era noite e, por isso, eu tomava todos aqueles cuidados típicos de quem tem mania de perseguição. Ou talvez isso seja apenas uma característica do homem moderno, com medo de se tornar mais uma vítima da violência.

Quando cheguei ao carro, notei que o garoto não estava por perto. Minha primeira reação foi de desgosto e reprovação. Logo pensei: “Eu sabia que ele não cuidaria o carro”. Olhei mais um pouco em volta e nada dele. Decidi ir embora. Já no carro, enxerguei pelo retrovisor uma figura magra, ruiva e sardenta, que subia a rua correndo. Era o menino. “Não cuidou o carro e ainda quer me levar uns trocados”, conclui. Quando já ia arrancar, ele gritou para que eu esperasse. O instinto me dizia para obedecê-lo.

O garoto chegou pedindo desculpas e confessou: “Eu tava na lan house, tia. Nem vi o tempo passar”. Curiosa, perguntei a ele por que gostava da lan house. Ele pensou um pouco e me disse que era divertido visitar os sites, conversar nas salas de bate papo, saber do que acontecia pelo mundo e jogar com os outros meninos. “Quando tô lá esqueço tudo. Parece outro mundo”, falou enquanto gesticulava. Sorri, porque não havia nada a dizer diante daquela situação emudecedora. Então tirei alguns trocados da carteira e parti.

No caminho, eu pensava naquele jovem. Não era nada estranho que gostasse do mundo virtual. Na lan house, ele era como qualquer outro menino em busca de diversão. A internet lhe oferecia um mundo novo, colorido e infinito, diferente da realidade. Na lan house ele não era pobre, excluído nem rejeitado. Como deviam ser mágicos aqueles momentos em frente ao computador. Era quando deixava de ser apenas um guardador de carros.


Larissa Campos

<$I18NNumComentários$>:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial